sábado, 1 de maio de 2010

CARTAS AO FILHO DO CORONEL

Passou a mão na cabeça, mas por hábito que para desalinhar o cabelo. Depois a mesma mão sempre vai ao nariz, também por hábito. Nervosa então, repete muitas vezes estas ações. Não estava necessariamente nervosa, mas ansiosa. Um fogo queimava-lhe o coração, mas a fogueira de boa madeira ardia-lhe entre as pernas. Desejo, muito desejo!
O objeto de suas ânsias, que fazia -lhe o vestido de algodão amarelinho ter vida própria, levantando ao sabor do vento, mostrando suas coxas grossas, estava ali, há alguns metros, ardendo-se também, num olhar de diabo querendo levá-la para o inferno. O diabo é branco, bem barbeado. Muito charmoso e não parece mau. Sem vergonha, descarado talvez, pensava ela, entre o desejo e o medo. Uma senhora de quarenta e três, bem casada, mãe.
Trocaram olhares, cumprimentos tímidos da parte dela, ousados da parte dele. Não era uma descarada. Mas o queria, e seu cheiro de homem não saiu-lhe mais do nariz. Isso junto com o fogo que já cremava o corpo todo, antes das cinzas, apertou as mãos, passou novamente no cabelo, levando ao nariz. Nada decidido. Mas sabia que tudo seria uma questão de ocasião.
E sem mais detalhes chatos e desnecessários, nossa lady Chatterley ao contrário, enquanto o marido cortava lenha dentro das matas, sem suportar mais seu suor de trabalhador. Cheira, inspira, o perfume do pescoço perfumado do filho do patrão, morde, sensual que nem uma vampira, sensual e cabocla e abre-lhe as pernas como uma flor a despetalar-se. O filho do coronel não cheira, lambe e quer devorar aquela flor. Selvagem e ordinária, de beira do caminho, com nome pobre de erva daninha. Devora-lhe, suga-lhe todo polém e depois é devorado docemente por ela.
Todos os dias daquele mês de férias, alongado para mais um fim de semana, encontraram-se nas salas, quartos, a beira do rio, no quarto que dorme com o marido. Tanto flor como o talo foram degustados pelo diabo branco e perfumado. Todas as vezes do dia que ele a encontrava chupava seus seios. Doia, mas um prazer tardio, a acompanhava até que se encontrassem em outra ocasião e ele a penetrava, de maneira que pudesse continuar sugando, mamando -lhe como um bebê. O que a deixava imensamente excitada e lhe dava muito prazer. Enquanto a vida passava sem tumulto e em paz no cotidiano dos outros. Até a despedida, que ela observou da janela, escolhendo arroz, fingindo não dar muita importância. Não ficaria mais sem amantes, pensou. O outro indo embora e o marido fedorento acenando.

sexta-feira, 26 de março de 2010

XOXOTA DE OURO EM FORMA DE BORBOLETA CRAVEJADA DE BRILHANTES



Estava bem bêbada, era uma mulher que sabia beber. Dançava então e sorria muito com seus curtos e coloridos cabelos, de acordo com seu humor os pintava, estavam vermelhos naquela noite.Tentava manter a alegria. Aos quarenta e nove anos, sua alma alegre e bem resolvida, estava inquieta. O espelho a incomodava. Não havia plástica para a alma. Então procurava não se incomodar com as mudanças do corpo.
Maria da Conceição olhou-se de ressaca na manhã seguinte. O espelho malicioso dizia que havia mulheres mais jovens. Como na puberdade pegou um pequeno espelho e viu refletido nele sua vagina, sua vulva, seus pelos. Gostava dos pelos. Mesmo que suas amigas trouxessem aquela parte em v constantemente lisa, depilada, asséptica. Alguns homens preferiam, atrizes de filmes pornográficos usam assim. Mas ela não, não pensava em agradar os homens. Achava uma vagina peluda de uma feminilidade ancestral. Na juventude tinha uma linda lasca em v! Alguma coisa havia mudado entre suas pernas, alguns pelos estavam brancos e crespos. Naquela região não havia como colorí-los. A esteticista rendia-se a necessidade de retirá-los a cera quente. Manteria algum traço de juventude que o tempo devorava rapidamente. Pensou rapidamente em homem, homens que desejava e em sua autoestima abalada. Quando? Em que ano perdeu sua cintura fina? Suas belas costas criaram vincos? Lembrou do poema de Cecilia Meireles. E olhou no espelho sua face. Ainda gostava imensamente dela, de seus olhos café, lábios grossos de negro e nariz indefinido, por ser bastante mestiça. Uma negra de pele clara.
Conceição aceitou o convite para sair com um homem mais jovem. Desconversou deixou a cama para outro dia. Amanhã olharia novamente com o espelho entre as pernas. Surrealistamente imaginou um implante de vagina com formato de borboleta, de ouro, cravejada de brilhantes, se fosse uma primeira dama talvez, trabalhadora autônoma, contentava-se com outro bichinho sexy, poderia ser uma joaninha, com paetês e pluminhas cor de rosa, cheirando mesmo a vagina, que é cheiro bom. Novamente se assustava, lera que aos cinquenta anos gradativamente a mulher perde o cheiro natural da vagina, o que não mais atrairia o homem. Medo! Bebeu muito outra vez, choveu, voltou para casa antes das duas da manhã. Dormiu, sonhou com vaginas voando e flatulentas.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

APRENDENDO A AMAR

Esse será o último amor da minha vida. Sinto isso, como uma verdade definitiva. Tento raciocinar... será mais uma faceta da manifestações do amor, das maneiras como sentimos  ou vemos  o amor   durante as diferentes fases da vida, adolescência, primeira juventude, amor na idade madura? Não será o último amor porque morrerei, não é isso. Também não sou romântica, não tenho sonhos de velhice acompanhada. Sou bem rabugenta e fóbica. Gosto imensamente da solidão, que traduzo por liberdade máxima.
O amor só me aconteceu por um desses acidentes incautos. Como pisar em falso e torcer o pé. Depois desta primeira fase, um tanto longa e dolorosa, como um engessamento. Tornou-se cotidiano como um amanhecer ou final de dia, que só percebemos se formos poéticos. Não podemos definir o amor senão pela poesia. Quantas páginas já foram escritas em verso e em prosa. Não há idioma que traduza nesse momento minha emoção. Tão bem guardada na "memória poética" que nos fala Kundera em a insustentável leveza do ser. Invasora e dominadora de todo meu ser que se revolta como um escravo rebelde.
É preciso render-se ao amor e esperar as voltas da vida. Sou impaciente, não suporto esperar, eis a minha dor. Amor é trabalho a dois, autonomia e dependência: tão contrário a si é mesmo o amor. Belo e trágico sempre.




RÊ BORDOSA

RÊ BORDOSA
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